
Módulo 2
Módulo 2
Período de 1934 a 1959 – do início da ação com os mais necessitados até a fundação das Obras Sociais Irmã Dulce.
Para a sua comodidade, ouça a audiodescrição deste espaço. Você pode pausar ou silenciar quando desejar.

“IGREJA EM SAÍDA”
MÁXIMA EXPRESSÃO DO AMOR
Santa Dulce dos Pobres transcendia os limites do convento, entregando-se às ruas para cuidar dos mais carentes. Foi “Igreja em saída” – termo usado pelo Papa Francisco na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium – em socorro às pessoas que precisavam de apoio material e espiritual. Com uma necessidade intensa de encontrar o Cristo da Paixão na dor dos desamparados, de forma voluntária, ela empreendia sua via-sacra diária, incorporando o sofrimento dos pobres e abraçando a cruz de Cristo.
Ao longo de sua jornada de amor e serviço, deu inúmeras provas de sua habilidade em ultrapassar limites e antecipar avanços sociais para ajudar aqueles que mais precisavam. Suas ações exemplificam a diversidade de seu protagonismo e de como sempre esteve à frente de seu tempo, fazendo a diferença na vida dos menos favorecidos. Santa Dulce dos Pobres, “antecipou”, típico dos santos, o Concílio Vaticano II, que compreendeu que a vida religiosa consagrada deve ser fermento de amor no mundo.
Santa Dulce dos Pobres junto a um enfermo.
AS PRIMEIRAS MISSÕES DA JOVEM FREIRA
Aos 20 anos, depois dos votos temporários, Santa Dulce dos Pobres retorna a Salvador, em setembro de 1934. Sua primeira missão foi no Hospital Espanhol, nas funções de auxiliar de enfermagem, sacristã, no Raio-X e na portaria. Em fevereiro de 1935, parte para sua segunda missão: lecionar as disciplinas de Geografia e História no Colégio Santa Bernadete, localizado no Convento da Penha, administrado por sua congregação. No entanto, o sonho de dedicar-se totalmente às pessoas necessitadas persistia em seu coração.
Não demorou para que esse desejo se tornasse realidade.
Alunas do Colégio Santa Bernadete, onde Santa Dulce dos Pobres ensinou Geografia e História, em 1935.

Em uma das suas funções no Hospital Espanhol, a primeira missão como freira.

AMPARO À CLASSE OPERÁRIA
Santa Dulce dos Pobres recebeu permissão de sua superiora para se dedicar às pessoas carentes. Em 1935, começou a trabalhar em prol da classe operária, frequentando as fábricas ao meio-dia e no final do expediente para evangelizar os empregados. Posteriormente, passou a visitar as famílias dos operários e promover batizados, casamentos, catecismo e cuidar dos doentes. Sentia-se feliz em compartilhar a mensagem de Jesus Cristo para essas pessoas. Em 1946, liderou a campanha da entronização da imagem do Sagrado Coração de Jesus, em várias fábricas de Itapagipe. Na Fábrica da Penha, na Ribeira, inaugurou uma biblioteca com 50 livros, jornais católicos e revistas.
Em 1º de novembro de 1936, Santa Dulce dos Pobres e Frei Hildebrando fundaram a União Operária São Francisco, uma instituição dedicada ao apoio social e religioso dos operários na região fabril de Itapagipe. Nesta época, não havia leis para proteger a classe trabalhadora. Em 1937, sob a liderança dos dois religiosos, a organização transformou-se no Círculo Operário da Bahia (COB), entidade que tinha a mesma finalidade e que se expandia por todo o país. Santa Dulce dos Pobres e Frei Hildebrando cuidavam dos operários e de suas famílias, abrindo portas de inclusão para aqueles que eram relegados à invisibilidade.

Santa Dulce dos Pobres em uma das fábricas, onde evangelizava os operários nas horas permitidas pelos empresários.

A primeira diretoria da União Operária São Francisco. Entre os dois freis franciscanos estão: Santa Dulce dos Pobres, Irmã Mathya e Irmã Nazareth.
EMPREENDEDORA NA VANGUARDA
Com o objetivo de captar recursos para a manutenção dos serviços prestados pelo Círculo Operário da Bahia (COB), Santa Dulce dos Pobres e Frei Hildebrando construíram três cinemas em Salvador: o Cine Roma, o Plataforma e o São Caetano. Com o crescimento da entidade, dedicaram-se à construção de uma nova sede, no Largo de Roma. Durante a obra, a religiosa sugeriu que a fachada do novo prédio fosse concluída antes do restante, visando estimular os doadores para facilitar a captação de recursos. Essa ideia surpreendeu o engenheiro, Norberto Odebrecht, que reconheceu a sagacidade da proposta. Tempos depois, ele definiu Santa Dulce dos Pobres como uma das maiores empreendedoras que conheceu. A inauguração da nova sede do Círculo Operário da Bahia ocorreu em 21 de novembro de 1948, com a presença do presidente Eurico Gaspar Dutra.

O novo prédio do Círculo Operário da Bahia em construção. Um empreendimento que foi pensado e
executado pela mãe e o pai dos pobres, Santa Dulce dos Pobres e o Frei Hildebrando.

As famílias dos trabalhadores que também eram assistidas pelo Círculo Operário da Bahia, com atendimentos médico e odontológico, cursos profissionalizantes, educação fundamental para as crianças, dentre outros.
AS OCUPAÇÕES DOS ESPAÇOS PÚBLICOS E PRIVADOS
A partir de 1939, Santa Dulce dos Pobres iniciou uma longa caminhada, ocupando espaços públicos e privados para abrigar pessoas em vulnerabilidade social. Essa iniciativa culminou na fundação das Obras Sociais Irmã Dulce, em 26 de maio de 1959. As casas da rua Ilha dos Ratos, as oficinas da Companhia de Navegação Bahiana, os arcos da colina da Igreja do Bonfim, o antigo Mercado do Peixe e o Galinheiro do Convento Santo Antônio foi o roteiro da peregrinação com os seus pobres.

Socorro aos pobres e doentes em situação de rua.
“Se fosse preciso, começaria tudo outra vez, do mesmo jeito, andando pelo mesmo caminho de dificuldades, pois a Fé, que nunca me abandona, me daria forças para ir sempre em frente.”
Santa Dulce dos Pobres
• A RUA ILHA DOS RATOS
No ano de 1939, em uma tarde tranquila, Santa Dulce dos Pobres seguia para o Convento da Penha, onde morava, quando encontrou um garoto doente na calçada, suplicando por socorro. Impulsivamente, levou-o até a Praça Conselheiro Nabuco, conhecida como rua Ilha dos Ratos. Abrigou o menino numa casa vazia, com a ajuda de um rapaz, que arrombou a porta em atendimento ao seu pedido. Esse gesto se multiplicou, atraindo mais pessoas doentes, levando-a a derrubar mais portas. Mesmo enfrentando a resistência do proprietário das casas ocupadas, ela continuou cuidando dos necessitados, semeando o início das Obras Sociais Irmã Dulce.

• OFICINAS DA COMPANHIA DE NAVEGAÇÃO BAHIANA
Após desocupar as casas na rua Ilha dos Ratos, Santa Dulce dos Pobres conseguiu autorização para instalar seus assistidos nas oficinas da Companhia de Navegação Bahiana. Para sustentar sua missão, buscava doações incansavelmente na região, tornando-se uma figura conhecida. Aos 26 anos, liderava várias ações sociais em prol dos trabalhadores e suas famílias, também cuidava do posto médico e da farmácia do Círculo Operário da Bahia. Em 1941, fez o curso de Oficial de Farmácia e o de Auxiliar de Serviço Social, em 1947.



Diplomas da formação técnica de Oficial de Farmácia, em 1941, e de Auxiliar em Serviço Social, em 1947.
• O SANTUÁRIO SENHOR DO BONFIM E O ANTIGO MERCADO DO PEIXE
Em 1945, teve que sair do abrigo instalado na Companhia de Navegação Bahiana, pois o local passaria por obras de revitalização. Levou seus pobres para os arcos da colina do Santuário Senhor do Bonfim, mas logo foi convidada a se retirar do local, pelo prefeito Wanderley de Pinho, pois o templo já era um famoso ponto de turismo na cidade. Identificou mais um alojamento na região, o velho Mercado do Peixe, porém, mais uma vez, foi alertada pelo prefeito e convidada a sair. As dificuldades que vivia, para cuidar dos seus pobres, eram motivo de grande angústia no seu coração.

Santuário Senhor do Bonfim, um dos locais onde Santa Dulce dos Pobres abrigou os seus assistidos. Atitude
que incomodou as autoridades da cidade.
• O GALINHEIRO DO CONVENTO SANTO ANTÔNIO
Diante de tantas rejeições, pediu autorização à superiora do convento, Irmã Gaudência, para usar o espaço do galinheiro do Convento Santo Antônio, onde moravam recentemente. Adaptou o ambiente com a ajuda de voluntários e alimentou os seus pobres com uma deliciosa canja de galinha. Era o ano de 1949. Neste local, com mais tranquilidade, Santa Dulce dos Pobres deu continuidade ao seu trabalho. Porém, as pessoas continuavam a chegar e, além do galinheiro, eram também acomodadas pelo entorno do Convento e do Círculo Operário da Bahia, juntando uma multidão de irmãos carentes. O galinheiro se tornou um pequeno ambulatório. Como ela dizia: “o amor constrói e solidifica”. Esta atitude foi um ato de Compaixão, pois a dor do outro era a sua dor.


Espaço do galinheiro do Convento Santo Antônio, onde Santa Dulce dos Pobres acomodou os seus pobres em 1949. O marco zero das Obras Sociais Irmã Dulce.
“Desde o primeiro dia que coloquei os doentes no galinheiro, me convenci de que tudo dá certo porque sou apenas um instrumento de Deus.”
Santa Dulce dos Pobres
ACOLHIMENTO À COMUNIDADE DOS ALAGADOS
Em 1948, surgiram as primeiras notícias sobre uma nova invasão no Caminho da Areia. Com o crescimento populacional, Salvador enfrentava escassez de moradias, afetando as pessoas mais pobres. Os primeiros barracos foram erguidos na estreita faixa de terra e se expandiram pelos espaços alagadiços entre a maré e o manguezal, formando a maior favela de palafitas do país, os Alagados. As Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição da Mãe de Deus, lideradas por Santa Dulce dos Pobres, começaram a ajudar a comunidade na assistência à saúde, alimentação, educação e orientação cristã. Na década de 1950, a religiosa criou uma rede de solidariedade, estabelecendo um banco de aleitamento materno para as mães recém-paridas com tuberculose. Parturientes saudáveis amamentavam os bebês das mães doentes, maximizando o conceito de maternidade responsável. Santa Dulce dos Pobres foi uma das pioneiras a criar o Banco de Leite Humano.
Posteriormente passou a ser lei, em maio, mês do seu nascimento, no ano de 1988. A imprensa de Salvador a apelidou carinhosamente de “Anjo Azul dos Alagados”, reconhecendo sua dedicação incansável à comunidade.


Assistência integral à comunidade dos Alagados.
O ACIDENTE QUE ABALOU SALVADOR
Em 1952, um trágico acidente abalou a cidade. Na manhã do dia 05 de janeiro, as irmãs do Convento Santo Antônio foram surpreendidas por um estrondo, seguido de gritos desesperados. O ônibus do ramal da Ribeira, de número 6214, colidiu com um bonde elétrico em frente à moradia das religiosas, resultando em dezenas de mortos e feridos. As irmãs do convento foram as primeiras a chegar para o socorro. Em ato corajoso, Santa Dulce dos Pobres, auxiliada por Irmã Hilaria, subiu em um caixote, quebrou o vidro lateral
do ônibus com uma pedra e conseguiu salvar várias pessoas que estavam presas às ferragens, arriscando a própria vida.

O acidente foi a manchete do Jornal Diário de Notícias, no dia 06 de janeiro de 1952.
A FUNDAÇÃO DAS OBRAS SOCIAIS IRMÃ DULCE
No final da década de 1950, Santa Dulce dos Pobres continuava a cuidar dos irmãos necessitados nas precárias instalações do antigo galinheiro e arredores. As crianças resgatadas das ruas eram acolhidas em barracões de madeira, instalados em frente ao Convento. O seu trabalho social já era conhecido e reconhecido pela sociedade. Em 1959, na data em que completava 45 anos, em 26 de maio, ocorreu a cerimônia de fundação das Obras Sociais Irmã Dulce. Em julho, desse mesmo ano, o governador, Juracy Magalhães, conheceu o seu trabalho de perto e a incentivou a construir um abrigo melhor para os seus assistidos. Então, com o apoio do governo do estado, da sociedade baiana e do COB, que doou o terreno, decidiu-se construir o Albergue Santo Antônio.

As crianças instaladas nos barracões tinham a atenção e o carinho que precisavam.

Cerimônia de fundação das Obras Sociais Irmã Dulce, em 26 de maio de 1959.



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